Rubens Cardoso admite carinho pelo Grêmio, mas fala em “amor” ao Inter e recorda gol com apoio do vento

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São raríssimos os jogadores que atingiram durante a carreira o que o ex-lateral-esquerdo Rubens Cardoso conseguiu. Hoje aposentado dos gramados e auxiliar do ex-goleiro Clemer, que busca um novo clube para seguir no futebol, ele olha para a prateleira de casa e vê taças importantes vencidas tanto com o Grêmio como pelo Inter. Mas qual é o seu time preferido em Porto Alegre? Essas e outras respostas você acompanha abaixo.

Zona Mista: Por ter vencido dois títulos de grande importância pelo Inter como a Libertadores e o Mundial de 2006, a sua identificação com o colorado é maior que com o Grêmio, que você venceu a Copa do Brasil de 2001? 

Rubens Cardoso: Eu tive o privilégio de jogar nessas duas grandes equipes, sendo da mesma cidade, do mesmo estado. Tive uma passagem fantástica pelo Grêmio, sendo campeão da Copa do Brasil de 2001. Aquele título ali me deu a possibilidade de me firmar no futebol brasileiro. Fui cotado para a seleção. Naquele sistema de 3-5-2, fizemos o melhor 3-5-2 do Brasil na época. Todo mundo queria espelhar o nosso sistema. Fui considerado um dos melhores alas nessa função. Depois disso a minha vida mudou. Eu era novo, estava começando e o mais difícil é se firmar no futebol. Começar uma carreira sólida em grandes equipes. Eu já tinha vindo do Santos e tinha que confirmar no Grêmio. Era a chance de demonstrar o meu valor dentro do futebol. E depois dei sequência. Tive a honra de marcar a história e ganhar grandes títulos com o Inter, como a Libertadores e o Mundial. Eu tinha perdido duas finais seguidas de Libertadores. Em 2002 contra o Olímpia, nos pênaltis, jogando pelo São Caetano. E no ano seguinte, 2003, com o Santos, diante do Boca. Eu era daquele elenco também. Aí, na terceira, foi a oportunidade que o Inter me deu. Era o meu sonho. Estava engasgado na garganta. E o início, pra ser sincero, não foi dos melhores. Existia uma certa desconfiança do torcedor colorado, mas depois dessa desconfiança e do título, das atuações, o torcedor colorado começou a me amar. E eu fui amando esse clube de uma tal maneira que veio a Libertadores, Mundial, Recopa, enfim. Ganhamos todos os títulos possíveis e foi um amor que explodiu. Tremendo. Por essa razão, de ter acontecido essa reciprocidade… eu respeito demais o Grêmio, tenho um carinho, mas o Internacional hoje está no meu coração. Sou colorado, torço mesmo pela instituição. Sou apaixonado pelo Inter.

ZM: Relembrando o Mundial de 2006, você viaja como reserva do Hidalgo, que se machuca antes do duelo contra o Barcelona. Como ficou a tua cabeça e como tu reagiu quando soube que iria jogar?

RC: Se a gente for relembrar, desde o início, eu vinha de uma lesão no Brasileirão e estava voltando. Tanto é que voltei em umas duas rodadas antes de finalizar o campeonato. A gente jogou o último jogo contra o Goiás, no Beira-Rio, e eu fiquei na reserva. Já vinha treinando, me sentia bem, apesar de estar sem ritmo. Eu voltava de lesão. Depois do jogo contra o Goiás, o Abel se reuniu com a comissão e decidiu dar uns dias de folga para nós. Para ficarmos com a família alguns dias e depois teríamos um tempo de preparação lá no Japão. A viagem seria longa. Eu chamei o Paulo Paixão e falei assim: “Eu quero treinar”. Jogamos no sábado contra o Goiás e no domingo eu queria treinar. Um sol do caramba. O Paixão falou: “Você tem certeza? Descansa, cara. Fica com a sua família, nós vamos ter tempo lá no Japão para treinar”. Mas eu queria treinar. E convenci. Viemos pro Beira-Rio trabalhar na caixa de areia. Uma hora, uma hora e 20. Eu treinei e falei: “Vou jogar o Mundial”. Queria estar bem preparado. Ninguém estava vendo, mas eu sabia que quando chegasse a minha vez eu estaria preparado. Essa era a minha convicção. Ainda treinei umas duas ou três vezes em separado com ele antes da viagem.

ZM: Aí o Hidalgo se lesiona logo na estreia contra o Al-Ahly.

RC: Isso. Chegamos lá. O Hidalgo estreou e lesionou logo no primeiro jogo. Foi aí que eu entrei no segundo tempo da semi contra o Al-Ahly. Só que eu estava muito preparado. Convicto que eu iria jogar, que eu iria tecnicamente e fisicamente ajudar. Isso me deu tranquilidade. Quando você se prepara para fazer uma prova, você fica tranquilo. E eu sou assim. Estava à vontade e convicto de que faria o meu melhor. Eu tinha muita fé que eu iria jogar. Confiante nisso. Até essa confiança e essa fé, e eu falei para alguns, que eu iria jogar. Quando o pessoal viu que eu substituiria o Hidalgo, o pessoal ficou tranquilo. Eu dei essa tranquilidade ao time. Um depende do outro e a confiança um no outro tem que ser absoluta. Na minha individualidade, eu iria ajudar o coletivo a sair com a vitória.

ZM: Puxando pelo lado gremista, aquele time de 2001, do Tite, que venceu a Copa do Brasil, foi um dos melhores que você jogou na carreira?

RC: Aquele time de 2001 foi um dos melhores que eu joguei. Como também esse time de 2006 do Inter. O do Mundial eu vejo como o melhor. O que ganhou do Barcelona foi a melhor equipe da minha carreira. O Grêmio de 2001 era muito bem treinado pelo Tite. Então, nós conseguimos montar um sistema que encaixou todas as peças. Na direita, o Anderson Lima que batia na bola como uma raridade. Cruzamento, faltas, lançamento. Porém, ele não tinha a velocidade que eu tinha na esquerda. A intensidade. Meu amigo, se falasse pra eu ir 30 vezes no fundo, eu ia as 30 com muita força. Existia um equilíbrio. De um lado, alguém mais técnico, que tratava bem a bola. Do outro, um cara mais de força. Eu era o desafogo, chegava sempre junto com o Luís Mário na frente. Todo mundo falava. Se não me engano, tem dois gols que eu chego na área dando um estirão e o Luís Mário cruzando do outro lado. Eu saía de trás e acompanhava um cara da frente. Com chegada surpresa. Era tudo muito bem trabalhado ali.

ZM: Méritos do Tite.

RC: O Tite, pra mim, foi um dos melhores treinadores. Como pessoa também. Ele mudou muito o conceito da forma como eu via os treinadores. Pra mim, existe um antes do Tite e depois do Tite. Vi que ele era o camarada que era o cara didático, o professor, que cobrava, que tinha um fator psicológico que eu nunca vi igual no futebol. Essa equipe jogou muito em função do Tite estar naquela gana, de estar no início da carreira e tinha essa condição de mexer no psicológico dos atletas. Ele levava o atleta ao limite. Era a diferença. Um time muito bem treinado e motivado, por isso o sucesso em 2001.

ZM: Por ter vivido intensamente a rivalidade Gre-Nal e conhecer o peso das duas camisas, na tua opinião, qual das duas torcidas apoia mais o time? Você citaria diferenças entre os gremistas e os colorados?

RC: Vivi os dois lados. Pude ser campeão gaúcho e da Copa do Brasil pelo Grêmio. Pelo Inter teve a Libertadores, o Mundial, a Recopa. As duas torcidas… eu vejo o povo do Rio Grande do Sul, eu tenho um carinho tão grande pelo estado, que é impressionante. Porque eu saio hoje, já parei de jogar, e vou na casa de gremistas e colorados. Tenho história pra contar das duas equipes. E é fascinante isso. É uma gratidão tão grande, porque que eu consegui algo que raríssimos atletas conseguiram, que é ganhar em dois clubes com uma rivalidade tão intensa. Posso dizer, de repente até pouco modesto da minha parte, mas sou amado pelas duas equipes. Pelas duas torcidas. O gremista vem, agradece, o colorado também: “Pô, te amo, sou grato pelo que você fez”. Então, cara, eu fico numa situação… mas sou colorado. Só que eu tenho um carinho grande pelo Grêmio também. Falando das torcidas, não tem diferença. As duas equipes têm torcidas fantásticas. Apaixonadas. Eu amo essas duas torcidas de uma forma especial, com muito respeito e carinho. Fizeram parte da minha vida. Eu as vejo de uma forma especial. São poucas as pessoas que entendem essas diferenças. São todos apaixonados. Tanto Inter quanto Grêmio estão de parabéns por terem duas torcidas maravilhosas.

ZM: Um dos primeiros gols do Inter na Libertadores de 2006 foi seu, contra o Nacional, no Beira-Rio. Você dribla o goleiro na ponta e, caindo, sem ângulo, acerta a goleira. Como conseguiu marcar daquele jeito? O que lembra daquele lance?

RC: Eu estava fazendo uma bela partida. Tem um detalhe. Eu sou um cara que penso muito o jogo. Gosto de fazer uma leitura, ter uma percepção em campo. O time estava bem, era o nosso primeiro jogo no Beira-Rio naquela Libertadores. A torcida veio com a gente. E um detalhe fez a diferença. Estava ventando muito. E no segundo tempo estávamos a favor do vento. Lembro que o Mossoró lançou a bola e eu antecipei o zagueiro, o goleiro e fiquei sem ângulo, mas fiz o gol. Uns minutos antes, eu chutei uma bola cruzada que eu não peguei bem. Ela ia saindo bem pra fora e o vento segurou. Se for pesquisar, aquela foi a pior bola da história da Nike. De todas que já fizeram. Era uma bola estranha, meio oval, diferente. Enfim… chutei aquela bola anterior e o vento fez ela curvar pra dentro. E bateu no pé da trave. O vento me ajudou e quase fiz o gol. Depois, aconteceu essa jogada e raciocinei muito rápido. Virei o quadril, bati meio de trivela e deixei que o vento me ajudasse também. Joguei a bola meio reta pro vento empurrar pra dentro. Foi isso. Aí vem a força, a técnica, a velocidade da jogada. Mas eu usei muito o vento naqueles segundos. Eu gosto de recordar aquele gol. Todos os colorados me falam daquele gol. Essa semana mesmo um torcedor me parou e falou: “Rubens, eu estava bem na Popular atrás da goleira e vi aquela fazendo a curva pra entrar”. Isso é fantástico. Me emociono, porque fiz parte de uma campanha vitoriosa.

ZM: Para fechar, Rubens. Você esteve ao lado do Clemer como auxiliar-técnico no Brasil de Pelotas até a saída do treinador. Pretende continuar nessa área? Quais os seus projetos atuais com o futebol?

RC: Estive com o Clemer e nós fizemos um trabalho espetacular no Brasil de Pelotas. Fizemos uma final no Gauchão de 2018 contra o Grêmio e fomos vice. O Grêmio vinha numa fase especial. Não só pela chegada, mas pelo trabalho desenvolvido lá dentro. Conseguimos com os mesmos jogadores fazer aquela equipe jogar. Terminamos em 8° na Série B, sendo que pegamos na zona do rebaixamento e o nosso time jogava. Mudamos a forma de jogar. Isso foi trabalho, não por acaso. Pretendemos seguir assim. O Clemer ainda não assumiu outra equipe. A gente estuda propostas pra dar sequência e estudar também pra melhorar. Crescer na profissão. É o projeto que nós temos. Buscamos uma equipe que nos dê condições de fazer um trabalho semelhante ou até melhor que fizemos no Brasil.

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